TEXTOS
Esculturas em bronze
Origem, Testemunho, Reflexão
Sobre a exposição:
“Origem, Testemunho, Reflexão”, é uma coletânea dos trabalhos de Sandra Guinle, renomada artista plástica (e também mãe de uma de nossas alunas), especialmente selecionada para a primeira mostra no MuseOn da Escola Americana.
O título “Origem Testemunho Reflexão” reflete a inspiração artística, o processo criativo de Sandra, além de contribuir com uma visão para a discussão sobre arte no futuro.
Sobre a artista:
A exposição reúne três partes distintas do trabalho de Sandra Guinle:
Maternidade, Cenas Infantis e Pequenas Bailarinas. Assim, a mostra oferece uma perspectiva holística da artista, cuja vida, espiritualidade e trabalho são profundamente interligados.
Nascida e criada às margens dos rios de Monte Mór, Sandra Guinle é uma força criativa, moldada pela magia de uma vida plenamente saboreada e profundamente apreciada.
Em seu trabalho, momentos aparentemente pequenos e banais da vida, transformam-se nos capítulos mais memoráveis da estória de uma pessoa, testemunham e nos lembram sobre inocentes verdades perdidas diante dos shopping centers e vídeo games.
O vocabulário fácil, cotidiano e icônico de Sandra, emite uma energia irresistível, lírica, brincalhona e aparentemente inocente.
É muito fácil esquecer o processo físico e rigoroso que está por trás das esculturas de bronze, ao vislumbrar seus elementos aéreos, que convidam aos visitantes à uma celebração.
Apreciando seu trabalho como um todo na forma de um totem universal, evidência irrefutável que a vida é vivida e valorizada durante a jornada.
Matthias Brendler
Rio de Janeiro, 3 de Março de 2007
Sandra Guinle tem o dom mágico de nos fazer voltar no tempo.
Sabe tecer os fios da fantasia. Sabe reconstruir em suas esculturas móveis as brincadeiras simples e anteriores á nossa época virtual.
Sabe refletir o gosto agridoce da pureza perdida.
Mas não se engane, sua arte é rigorosa, executada com cuidado.
Nesse campo tão especial e difícil das artes plásticas que é a escultura,
Sandra é um sopro de ar fresco, uma inspiração bela.
Luiz Felipe Lampreia
Diplomata / Embaixador
São Paulo, 2005
A caixa mágica de Sandra Guinle
Anita Malfatti estudou em Paris e Nova Iorque, conviveu ao longo de sua juventude cosmopolita com os artistas mais badalados e ̈ilustres ̈ do seu tempo. Aos 45 anos, parecendo cansada de todas as construções teóricas e de suas contradições, Anita viajou por Minas Gerais e encantou-se com a simplicidade dos costumes, das pessoas e até com a cumplicidade daquelas paisagens de interior, que parecem desenhos de crianças.
Uma outra pintora paulista, Djanira, após uma vida de privações e sofrimento, procura-se a si mesma na arte aparentemente simples e naïf que produz. E, também já amadurecida, recusa-se a seguir quaisquer cânones ̈...Nunca voltei atrás, nem z concessões...dias e noites trabalhando sozinha, consultando minha consciência. Vi que só tinha um caminho a seguir: partir de mim mesma...”
Isto nos faz lembrar de outro artista, o russo Marc Chagall, que depois de um profundo aprendizado em seu país e na França, parte em busca dos temas folclóricos, longe de contextos racionais, explorando
sonhos e lembranças, também à procura de uma infância perdida.
Estes três artistas conviveram com as guerras mundiais, em momentos terríveis para a humanidade – e suas obras, em alguma fase, procuraram respirar numa atmosfera longe da realidade escura e sangrenta.
Sandra Guinle morou no interior de São Paulo, nasceu e teve sua infância marcada pelo ambiente de paz e carinho. Mas o mundo cou tão cruel, ou pior, que no tempo dos três artistas citados. Sumiram os brinquedos simples e feitos em casa, freqüentemente imaginados e executados pelas próprias crianças. As festas infantis são regadas a Coca-Cola e infernizadas com música techno. Os pais, atormentados por problemas de trabalho e nanceiros, parecem não ter mais alegria para dar. E as crianças, vagam pelas escolas – quando elas existem – com olhares de adultos preocupados.
E reinando sozinho, silencioso e implacável, sua excelência o Computador. Agora, aquelas crianças que o possuem, consomem na sua frente os tempos que antes se destinavam às brincadeiras. Poucas alternativas lúdicas foram procuradas para humanizar os computadores. As crianças estudam inglês, fazem ginástica, ocupam todos os minutos de sua infância e, robotizadas, competem, competem, competem. Este foi o mundo que Sandra Guinle encontrou quando ̈acordou ̈ de suas recordações. E então decidiu regressar a esse local mágico que foi a sua infância e a infância de cada um de nós.
Foi há tão pouco tempo, parece que foi ontem, que se pulava amarelinha e se caía no riacho, indo ao quintal pegar uma maçã ou uma couve. Sandra não se conforma: é possível resistir, reverter essa ̈educação ̈ à qual fomos levados por este mundo, no qual o dinheiro circula livremente à velocidade da luz, enquanto as pessoas são proibidas de, simplesmente, se deslocarem de país para país?
Numa época em que se fazem instalações, se realizam performances, em que se embrulha o Central Park, Sandra permanece el à sedução clássica do barro e à robustez eterna do bronze. Tendo suas raízes visivelmente ncadas no Modernismo brasileiro, na tradição de Maria Martins, Portinari, Bruno Giorgi, Teruz e Cesquiatti, ela nos convida para uma volta às fontes emocionais, ao universo mágico, mas ainda talvez possível, de um retorno à racionalidade.
Raul Luis Mendes Silva
Ensaista
São Paulo, 2005